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A ternura de meu pai

Publicada em 25/04/17 as 09:06h por Gabriel Chalita - 334 visualizações

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 (Foto: Reprodução )
Meu pai era um homem terno. Gostaria de estar com ele. Gostaria de ter tido o poder de prolongar o tempo. O tempo das prosas de tantos entardeceres. Juntos. Infância regada a exemplos. Gentileza natural nascida na crença de que o outro merece sempre o nosso melhor. 
Calvários doloridos os de meu pai. Foi preso, injustamente, na época da ditadura Vargas. Trabalhou com afinco. Primeiramente, para ajudar os pais. Limpou escolas, plantou em hortas, vendeu na feira, trabalhou no comércio, virou comerciante, empresário, construtor. Não teve oportunidade de estudar. Estudou, entretanto, a alma humana, com tamanha delicadeza e paciência que se formou mestre na área complexa de compreender que o outro merece ser respeitado.

Sofreu meu pai pela morte de dois filhos. Chorou a inversão da lógica. Um morreu aos 21 anos, acidente de carro. O outro de complicações no pulmão, aos 33. Tinha síndrome de Down. Era o centro da casa. Alegria contagiante de quem não tem economia em expressar os sentimentos.
Era profundamente religioso. Gostava do sagrado. Das celebrações eucarísticas. Da comunhão com os seus irmãos. Da reza silenciosa em sua cadeira de balanço. Esta é uma das lembranças mais lindas que tenho dele. Rezando. E eu, cheio da curiosidade de criança, queria saber o que ele pedia a Deus, em oração. Ele fazia segredos, sorria, dizia que eu fizesse o mesmo e que deixasse meu coração ir dizendo, apenas isso. "Deus escuta o nosso coração", dizia-me ele, com um sorriso generoso. O coração é a metáfora do que se sente. De onde dói. Do que faz bem. Dos sonhos que servem de combustível para prosseguir.
Meu pai era um homem bom. Soube partilhar o seu dinheiro. Dizia que Deus fizera dele um velhinho rico e que era preciso cuidar dos velhinhos que não tiveram a mesma sorte. Ainda hoje, na minha amada terra natal, Cachoeira Paulista, há o Asilo dos Vicentinos que ele construiu.
Meu pai era um homem trabalhador. Com o tempo, comprou um sítio e, ali, plantava café. Gostava da terra. De plantar e de colher. Um dia me confidenciou que pedia a Deus que não o deixasse em uma cama enfermo, como seu irmão mais velho. Era triste demais viver sem trabalhar. E que queria morrer trabalhando. E, assim, ele foi. Depois de um casamento. Depois de uma festa. A partida. Dolorosa partida. Rápida como ele queria. Difícil para os que dele se alimentavam de sua ternura.
Falo de meu pai como exemplo de um amor que nos molda. Cada um tem sua história afetiva com seus próprios pais. Alguns sofreram mais com pais violentos ou ausentes ou, estranhamente, pouco amorosos. O amor é elo sem o qual a engrenagem familiar não funciona. Mas mesmo os que lamentam os erros dos pais, em algum momento, podem mergulhar nos seus acertos. Ninguém erra ou acerta o tempo todo. Conheço filhos que lastimam, o tempo todo, os erros dos pais. Que contam histórias de alcoolismo e de exemplos desagradáveis. Mas e os afetos?  E os bons momentos que, não raro, ocorreram? A memória não pode abandoná-los. Até mesmo o sentimento de falta do pai, no dia de hoje, que muitos devem estar sentindo, é um indício de que há o desejo de que, ao menos, "aquele momento" estivesse ainda presente.
No dia dos pais, símbolo que nos ajuda a refletir, valem alguns dizeres aos pais que estão por perto. Se falta dinheiro para o presente, vale a presença de palavras que agradecem, que celebram, que reconhecem. Vale a presença de gestos de amor. Se eu pudesse, abraçaria longamente, meu pai, neste dia. Se eu pudesse deitaria em seu colo e brincaria com ele para ver qual das mãos é a maior: a dele ou a minha. Ele tinha mãos grandes. E eu dizia que, um dia, as minhas seriam maiores que as dele. E brincávamos de medi-las. Ele sempre ganhava. Na época de sua morte, repetimos emocionados "nossa" brincadeira e eu lhe disse que as dele continuavam maiores. Ele piscou, sorriu e disse que, há algum tempo, percebia que eu dobrava um pouco os dedos para que a mão dele continuasse maior. Mas que ele tinha muito orgulho de saber que as minhas mãos eram maiores que as dele. Que, para um pai, isso não era um problema. E que sonhava que eu continuasse crescendo. Nas mãos, no caráter, na vida e nos sonhos de construir um mundo melhor. De ser bom. De ser uma pessoa de bem.
Meu pai compreendia as minhas inquietudes. Ouvia os meus lamentos. Celebrava as minhas conquistas. Pai é assim. Presença que acalma e que alimenta de vida a vida dos seus filhos. Um filho que nega os pais é como árvore sem raiz. Nutrimo-nos do solo que nos gerou e devemos a ele voltar sempre na presença dos nossos pais ou na memória do que eles em nós plantaram.
Tento reproduzir a sua ternura. Sou ainda um aprendiz.
Feliz dia aos pais!

Ao meu pai José
Pai querido, é pena que já partiste
És saudade presente
Do tempo que, na minha mente,
Ainda existe
Os teus olhos tão vivos, tua mão, que suave
Conselhos constantes e os gestos marcantes
De quem ensina sem desanimar
Tua voz tão segura e plena de amor
Caminho infinito de quem, qual num rito
Toma cuidado para não deixar dor
Caminhas comigo, em cada momento
Vives ao meu lado em qualquer ação
Orienta meus passos teu ensinamento
Inteligência não vive sem o coração
Tu és simples sapiência, bondade, és motor
Princípios eternos, valores presentes
Prolongam no tempo o belo exemplo
O teu grande valor, sempre sem medida
Valor de oração, de trabalho diário
Suave encanto presente na vida
E teu romantismo : único amor
Exemplo de vida, marcante, constantes
Meu jamais esquecido, poeta sonhador
E teu romantismo : mamãe era rosa
Flor e princesa, único amor
Exemplo de vida, marcante, constante
Meu, jamais esquecido, poeta sonhador
E teu romantismo : mamãe era rosa
Flor e princesa, único amor
Exemplo de vida, marcante, constante
Meu, jamais esquecido, poeta construtor
Pai querido.

(Gabriel Chalita)

Por: Gabriel Chalita (fonte: Diário de S. Paulo) | Data: 09/08/2015




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