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Sobre a transitoriedade dos dias

Publicada em 14/09/17 as 17:53h por Clarissa Câmara - 328 visualizações

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 (Foto: Reprodução )

Monges budistas fazem enormes mandalas nas ruas com areia colorida. Eles desenham por horas, às vezes dias e depois, passam uma enorme vassoura de ramos e galhos limpando tudo. A beleza desse gesto? Tudo é transitório.

Tenho passado os últimos dias rememorando essa frase em mim. Fiz pequenas viagens, conheci algumas pessoas, estive muito tempo sozinha. Em tudo isso, me recordo de uma das passagens bíblicas que mais me trouxeram confusão, aos 12 anos de idade, quando meu pai preparou pra mim uma rotina noturna de leituras que incluíam a mesma. A passagem está registrada ao longo dos doze capitulo do livro bíblico de Eclesiastes. Na época meu pai repetia quase que irritantemente: este é um dos mais importantes escritos da humanidade. Eu não entendia. Há que se crescer um tanto, viver alguns reveses pra entender. Durante todo o livro, Salomão tenazmente repete: tudo é vaidade. Em algumas traduções o trecho fica: tudo é ilusão. Eu traduziria como "tudo é transitório".

Foi isso que pensei dia desses quando presenciei numa rua acima a que eu estava caminhando, um casal jovem tendo uma discussão. Ela tinha longos cabelos castanhos (muito bem cuidados por sinal) e ele me parecia um rapaz de quase trinta anos muito bonito. Ela estava aos prantos, falava alto mas não o suficiente pra atrair a atenção das pessoas. Ele estava cansado de alguma coisa. Os dois andavam em frente a uma padaria muito famosa aqui em São Carlos. Eu tentando atravessar a rua, falei com meus botões: eles deviam entrar e tomar um café, um suco ou qualquer coisa que os fizessem ficar de frente pro outro e conversar.

Eles não entraram. Eu atravessei a rua e entrei na farmácia ao lado, pensando nisso. Por que não entraram? Por que ela insiste em chorar? Por que para a maioria das pessoas tudo se resume em morrer de raiva, lamentar e reclamar com o amigo? Por que sofrer?

Carlos Drummond de Andrade escreveu certa vez para uma coluna da Folha de São Paulo que a educação para o sofrimento evitaria senti-lo com relação a casos que não merecem. Eu vi essa frase sendo usada de forma grotesca por alguns jornalistas ao se referirem sobre a relação professor-aluno, quando na verdade, Drummond fala que o sofrimento deveria ser um assunto aberto, às claras. Eu deveria conversar mais com meus amigos sobre sofrimento, de forma que estivéssemos cientes do que é a dor, e não venhamos a lastimar em vão. Deve-se sofrer por algo que se deve ser sofrido. Pois bem. E por quê sofrer pelo não sofrível? Por que as vezes insistimos em reclamar e açoitar nossas almas com um barbante de lã?

Porque somos altamente dependentes emocionais de outras pessoas, geralmente indivíduos que dividimos uma estrada, que sabe mais sobre nós do que nós mesmos. Nos acomodamos irredutíveis a situação de aceitar tudo o que o outro sente e tudo o que outro diz. Quando percebemos que estamos saindo do centro de referência do outro, aceitamos um problema qualquer, o tornamos maior que o que é de fato e empurramos goela abaixo tanto de nós mesmos quanto do outro. Trocando em miúdos: estamos chamando a atenção dele.

Essa é uma forma de fazermos o nosso parceiro ou parceira tomar ciência de que estamos ali ainda. É uma maneira que criamos de estarmos inseridos no contexto em que vivemos, quando às vezes não nos sentimos plenos naquele lugar. É uma maneira de percebermos a nossa existência. Não me compreenda mal, não é sempre que um problema acontece por essas vias. Mas quase sempre, o problema não é um problema.

Tudo é transitório, caro leitor. Quando o personagem bíblico assume que tudo é vaidade, ele quer dizer em outras palavras que tudo é passageiro. Tudo transcende a escala da realidade, da temporariedade e deixa de existir. Tudo, absolutamente tudo. Mas há umas miudezas que conseguem prevalecer e persistir. Experimente dizer que ama alguém. Qualquer pessoa. Diga que o admira.

Há aproximadamente 8 mil anos, um dos povos mais antigos da Terra deixou gravado em tabuas de marfim um poema que foi escrito em hieróglifos por alguém, do sexo masculino (não sei como os cientistas identificaram o raio do sexo do autor) para uma mulher, que pelos versos, era a filha de um líder daquele povoado. Neles diziam haver um amor profundo, algo comparado a natureza e suas dimensões e era imensurável como o céu. Mas ele jamais teria coragem de dizer-lhe isso. Fiquei injuriada quando li isso. Meu Deus, por quê?

8 mil anos e somente agora esses versos foram descobertos, traduzidos e refeitos em papel A4. Datado por carbono 14. E a tal da menina jamais soube que alguém zelava por ela com seu amor. Ela jamais soube que no meio de animais ferozes, povos selvagens e um clima massacrante, alguém pensava nela. Eu imagino que era esse o cenário de 8 mil anos atrás.

Mas não importa. Não sei onde a gente anda com a cabeça, quando vemos o tempo passar, várias rugas aparecerem, alguns cabelos brancos à mais e umas dores laterais e continuamos a sofrer por coisas que já vimos ser solucionados em nossa própria vida dezenas de vezes. Não sei o que raios acontece conosco, quando perdemos tempo fazendo pequenos dramas, quando na verdade tudo se resolveria com um pouco de olhar, mãos sobre mãos e um gesto simples chamado abraço, conhecido há aproximadamente 10 mil anos, mais ou menos o tempo daquele casal dos escritos em marfim.

Você tem alguém por quem zelar, eu sei. Ninguém está completamente sozinho nesse mundo. Tem sempre alguém na memória a qual você pensa pelo menos três vezes ao dia, geralmente enquanto faz o café da manhã, estende roupas no varal e faz uma pausa sorrateira pra ver um videozinho no Youtube. Alguém por quem sua alma faria mil mandalas. Alguém por quem você reza com cuidado. Então pare de perder tempo com transitoriedades e deixe uma marca bonita. Não em uma pedra. No coração de alguém por quem você faria o seu melhor. De alguém que te faz melhor.






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